A Agência Nacional de Águas (ANA) está proibindo novas outorgas para irrigação nas bacias hidrográficas dos rios São Marcos e Pardo, que cortam os estados de Goiás, Minas Gerais, Bahia e Distrito Federal, em região conhecida por ter se tornado a área mais irrigada da América Latina.
Em Goiás e MG, a emissão de novas outorgas está suspensa até a conclusão de um novo marco regulatório para a bacia do rio São Marcos, informou à Agência Nossa o superintendente de Planejamento da ANA, Sérgio Ayrimoraes.
A revisão das regras está em andamento, embora o Comitê responsável pela bacia já tenha deliberado sobre o tema, com a aprovação de um marco regulatório. A reguladora suspendeu novas outorgas após o comitê responsável ter definido as bases deste marco, que prioriza a irrigação no uso da água.
“O comitê trabalhou dois anos para o marco regulatório da bacia de São Marcos e após aprovação o apresentou aos órgãos envolvidos para verificar as medidas necessárias para a implementação. A ANA identificou que havia oportunidade para aprofundar estudos de disponibilidade hídrica. Esses estudos estão sendo planejados”, afirmou o presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Paranaíba (que inclui o rio São Marcos), Breno Esteves Lasmar.
O crescimento da produção agrícola e a instalação da Usina Hidrelétrica da Batalha tornaram necessário planejamento no uso da água da região para acomodar o consumo. Há conflito pela água na região.
“A situação hoje é que já se tem um marco aprovado, válido no âmbito do comitê e todas as ações para melhorar são fundamentais para que a gente possa tomar decisões cada vez mais acertadas”, afirma Lasmar.
A bacia do rio São Marcos banha parte dos municípios de Cristalina (GO), Unaí e Paracatu (MG), e uma pequena porção do Distrito Federal. É importante fonte de água para a região fortemente concentrada na atividade agrícola.
“A instalação da usina foi um equívoco muito grande. A vocação da bacia é a produção de alimentos muito antes da usina. Temos equipamentos para irrigação há muito tempo nesta região… Acho que não só a ANA voltou atrás como também tirou a legitimidade de uma decisão tomada pelo comitê de bacia”, dispara o secretário-executivo da associação que reúne irrigadores na região, Bruno Vicente Marques.
Pesquisadores da Embrapa concluíram que a área irrigada por pivôs centrais na bacia estava bem acima do volume pactuado no marco aprovado.
“Imagine se (a ANA) dá outorga agora e lá na frente não tem água? A situação é de cautela”, pondera o presidente do comitê da bacia.
Uma medida semelhante acontece na bacia do rio Pardo, que percorre os estados de Minas e Bahia. Um marco regulatório elaborado pela ANA e publicado em dezembro de 2018 suspende a emissão de novas outorgas abaixo da PCH Machado Mineiro em função da indisponibilidade de água para novos usos. Por isso, a ANA está indeferindo novos pedidos de outorga para irrigação na região.
Minas e Bahia estão entre os estados com maior retirada de água para irrigação, mas o estado com a maior vazão para esta finalidade é o Rio Grande do Sul, um dos maiores produtores de arroz que requer o tradicional cultivo sob inundação.
A restrição de uso para irrigação também tem sido adotada em áreas afetadas pela seca, sobretudo em reservatórios do semiárido. Um exemplo é o açude Epitácio Pessoa (PB), também conhecido como açude Boqueirão, que é utilizado para abastecimento da região de Campina Grande (PB) e do Cariri Paraibano. Nele a irrigação ficou suspensa durante três anos. No Piranhas a irrigação também foi suspensa por três anos até novembro de 2018, devido à recarga dos açudes.
O objetivo é priorizar a utilização da água disponível para abastecimento humano, uso prioritário da água em situações de escassez hídrica segundo a Política Nacional de Recursos Hídricos.
A restrição do uso da água para irrigação foi aplicada, principalmente, em diversos corpos hídricos localizados nos estados da Bahia, Ceará, Minas Gerais (norte do estado), Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte. No auge da seca, entre 2014 e 2016, também foram baixadas regras de restrição de uso em mananciais de São Paulo, Rio de Janeiro e Distrito Federal, dentre outros estados. A medida de prevenção, ou preparação, para o período seco é a alocação de água, em que o acumulado no período úmido é repartido entre os usuários no período de estiagem, segundo critérios de priorização.
A alocação de água é realizada anualmente pela ANA e é um processo de gestão empregado para disciplinar os usos múltiplos em regiões de conflitos, assim como em sistemas que apresentem alguma situação emergencial ou que sofram com estiagens intensas. Com caráter participativo, são realizadas reuniões nos locais afetados, com a presença de órgãos gestores das águas, operadores de reservatório e representantes daquela comunidade, para definir um planejamento especial.
Este processo busca encontrar soluções e alternativas para atender cada uso da água nestas regiões. Nesse sentido, a ANA desempenha o papel de interlocutora entre os usuários e entidades envolvidas para melhor tomada de decisão sobre a utilização da água.