Sai presidente de esquerda, entra presidente de direita – e a polêmica do preço dos combustíveis continua a mesma. Controlar os valores cobrados pela Petrobras pode levar a estatal a endividamento elevado, como já aconteceu. Deixar o custo à mercê das cotações internacionais, por outro lado, afeta fortemente o consumidor e a economia brasileira.
Mas houve um período em que os preços flutuaram livremente, sem afetar a Petrobras, e foram ao mesmo tempo amortecidos ao consumidor, por meio de um colchão. O amortecedor pode ressurgir a qualquer momento, como indicou o vice-presidente Hamilton Mourão ao defender a criação de um fundo custeado por royalties.
A Agência Nossa apurou alternativas em estudo para evitar que consumidores sejam afetados pela alta dos preços da gasolina e do diesel sem prejuízo para a Petrobras.
O vice-presidente sugeriu no começo desta semana a criação de um fundo soberano abastecido com royalties do petróleo.
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De acordo com fontes do setor, a proposta sugerida por Mourão pode ter relação com a Cide-Combustíveis (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), criada em 2001 justamente para exercer a função de amortecedor nos preços dos combustíveis.
Com a abertura do setor de petróleo, a ideia era deixar que os preços da gasolina, do óleo diesel e de outros derivados de petróleo flutuassem livremente sem que os consumidores fossem afetados pelas alterações bruscas das commodities no exterior.
“Entendemos que governo pode sim usar a Cide, que já está existe e já funcionou para esta finalidade”, afirma Paulo Miranda, presidente da federação que reúne empresas de postos de gasolina (Fecombustíveis). “Mas hoje fica difícil aumentar (a Cide) porque a perspectiva do barril de petróleo é subir”.
Fundo como combustível da Cide
O consultor Dietmar Schupp, especialista em tributação de combustíveis, avalia que o fundo soberano poderá ser ponto de partida que a Cide precisa para voltar a ser usada como amortecedor.
Com o fundo não haveria necessidade de aumento de imposto, que cairia num primeiro momento para estabilizar preços externos em alta. Num segundo momento, de queda de preços no mercado internacional, o imposto aumentaria, sem que fosse necessário mexer nos preços na ponta do consumo.
“Na minha visão, a solução para isso é se a gente conseguisse criar um fundo soberano com base nos royalties do petróleo, e esse recurso, quando houvesse essas flutuações, fosse utilizado para amortecer os aumentos. Não tem outra solução fora disso aí”, disse Mourão nesta semana segundo publicou a Reuters.
A criação deste fundo soberano, segundo Schupp, deverá ser aplicada sobre o excedente de produção de petróleo, para evitar perdas no orçamento dos governos que recebem royalties e das petroleiras.
A Cide foi usada principalmente nos anos 2000, com alíquota robusta que despencou em 2010, no caso da gasolina, e em 2008 sobre o diesel.
Em momentos de alta no preço do petróleo e/ou do dólar, o valor do imposto recuou. Já em momentos de queda do preço internacional, a Cide aumentou. O preço ao consumidor ficou estável, sem aumentar em tempos de alta da commodity; sem cair em momentos de queda nos preços internacionais.
O imposto chegou a render mais de R$ 8 bilhões anuais, mas uma série de mudanças na legislação acabaram engessando a Cide.
“A Cide foi deturpada ao longo do tempo porque primeiro se começou a dividr a Cide entre União, estados e municípios e a ideia do fundo é que se tenha dinheiro disponível para diminuir a volatilidade dos preços dos combustíveis quando acontecer aumento grande no mercado de petróleo, então a Cide não atende mais isso”, afirmou o presidente do Centro Brasileiro de Infraestrutura, Adriano Pires.
Para o consultor, a solução é a criação do fundo soberano levantada nesta semana por Mourão.
A submissão da CIde à chamada noventena, que estabelece períodos mínimos de 90 dias para reajustar impostos para cima, também afetou sua capacidade de oscilar para servir de colchão de preços. Mas isso pode ser revisto, segundo Schupp.
O governo zerou a Cide sobre diesel há dois anos, no episódio da greve dos caminhoneiros, baixando o preço ao consumidor. Na gasolina, são 10 centavos por litro. O valor é baixo se comparado aos volumes anteriores, quando o imposto foi realmente usado para conter impacto no bolso do consumidor. Nos anos 2000, foi cobrado até R$ 0,28 por litro da gasolina.