Projetos sociais da sociedade civil com vistas ao amparo da crescente população de rua e da fome na cidade do Rio e arredores têm se proliferado, mas sem coordenação para uma ação efetiva. Não há mapeamento de projetos, tampouco dados atualizados sobre moradores de rua, o que dificulta a adoção de políticas públicas eficientes.

Em busca de um mapa das iniciativas sociais da sociedade civil que prestam suporte às pessoas em situação de vulnerabilidade social, a reportagem tentou contato com o Instituto Pereira Passos (IPP) que, não tendo esse dado, indicou a Secretaria Especial de Ação Comunitária (SEAC) do Rio. A secretaria, por sua vez, encaminhou contato da Secretaria Municipal de Assistência Social (SMAS), mas também não houve informação sobre essa demanda. O subsecretário de Segurança Alimentar e Nutricional de Niterói, Igor Barcellos, também informou que não há um mapeamento dos projetos sociais atuantes em Niterói.

“Não existe um mapeamento propriamente dito, mas existe uma rede atuante na cidade que é contemplada pela política do banco de alimentos e da campanha Niterói Solidária. A rede é constituída de instituições socioassistenciais, credenciadas pelos Conselhos de Assistência Social ou de Segurança Alimentar e Nutricional de Niterói”, relatou o subsecretário. 

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Especialista em responsabilidade social e terceiro setor, o professor Pedro Ronan Marcondes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) comenta que é importante traduzir não só o impacto econômico, mas também o impacto social que essas iniciativas têm onde atuam. Além disso, elas contribuem de forma direta para a segurança alimentar, para a geração de renda, para a saúde, educação, esporte e lazer. 

“Elas vão alcançar pessoas e espaços que não raro vão estar invisibilizados pelas políticas públicas, elas vão chegar nas capilaridades gerais de atendimentos e vão ser, sim, as responsáveis pelas oportunidades de forma direta e indireta para o desenvolvimento desses públicos atendidos”.

A Operação Marmita, nascida no começo deste ano, com presença na Zona Oeste do Rio de Janeiro entre Campo Grande e Valqueire, constata que a cada ação nas ruas há um aumento de pessoas em situação de vulnerabilidade. 

Operação Marmita: a cada saída, mais moradores de rua são encontrados. Foto: Divulgação

 

“É uma situação muito difícil. É muita gente! A gente não tinha noção de que era tanta gente e está cada vez mais aumentando essa população de rua. Tem gestante, tem idoso, tem criança, tem adulto. A gente vai lá dar a comida e você vê o desespero na cara daquelas pessoas”, conta a voluntária Ana Flávia Rodrigues, uma das idealizadoras do projeto.

Segundo ela, que é estudante de Jornalismo, o projeto começou atendendo quase 60 pessoas, passou para 100, 150, 180 e nesse mês nós vamos atender 250. 

De acordo com boletim divulgado pela Rede de Pesquisa Solidária (RPS), em junho de 2021, as lideranças comunitárias ressaltaram a preocupação com o avanço da fome e o crescimento de pessoas em situação de vulnerabilidade alimentar. No último levantamento feito pela RPS, os problemas gerados pela atual crise levaram à máxima de 72% nos relatos sobre fome e falta constante de alimentação. 

Plataforma conecta quem quer ajudar a programas sociais da Prefeitura do Rio 

No estado do Rio de Janeiro, segundo levantamento divulgado pela Casa Fluminense, dos 22 municípios da região metropolitana, sete ultrapassam o limite de cinco mil famílias cadastrados  por unidade no CRAS (Centro de Referência de Assistência Social). Dentre os municípios, a capital apresenta o número de 11.453 famílias, ficando atrás apenas de Nova Iguaçu, cidade que compõe a baixada fluminense. Já o município de Niterói, onde a renda média dos moradores é de R$ 3.114, uma das maiores da região metropolitana, aparece em décimo lugar com 3.539 famílias cadastradas no CRAS.

A Prefeitura do Rio conta com uma plataforma digital (https://prefeitura.rio/voluntario) pela qual qualquer pessoa, projeto ou organização pode entrar e verificar as demandas de vulnerabilidade da população nos locais de assistência de cada região, e, assim, escolher como e o que quer doar. O projeto VoluntaRIO, tem a proposta de impulsionar a solidariedade carioca, de acordo com a As informações conseguidas através da assessoria de comunicação da Secretaria Municipal de Assistência Social do Rio de Janeiro.

“A Assistência Social tem atualmente 118 equipamentos espalhados pelo Rio: 14 CREAS (Centros de Referência Especializados de Assistência Social) e 38 unidades que abrigam população em situação de rua; 47 CRAS; e 19 Conselhos Tutelares”, informou a Secretaria Municipal de Assistência Social.

Turma da sopa apoia moradores de rua em Niterói. Foto: Divulgação

 

Apesar de não haver dados para medir o crescimento, é visível nas ruas que a população sem teto aumentou. Para o projeto Turma da Sopa de Niterói, nascido em 2013 e que se reestruturou em 2015, a situação é de agravamento dos problemas: 

“Houve um aumento na demanda, muitos pedidos de socorro, muitas pessoas na rua. Cada vez mais, uma coisa que nós quase não estávamos encontrando na rua eram famílias com crianças. Hoje, nós estamos observando a família completa na rua”, conta Dona Geralda, voluntária do projeto. 

Joice Monteiro, de 34 anos, moradora do centro de Niterói e manicure, trabalhando apenas com alguns atendimentos esporádicos, mora com os três filhos e o marido, também desempregado no momento.

 “A Turma da Sopa está sendo uma das melhores coisas que aconteceram na minha vida e na vida dos meus filhos”. 

De acordo com o subsecretário de Segurança Alimentar e Nutricional de Niterói, as instituições de ação social são abastecidas com alimentos e se tornam refeições, atendendo crianças, jovens, adultos e idosos. Segundo Igor, atualmente há  21 instituições credenciadas no banco de alimentos, mas  durante a pandemia algumas  pararam de funcionar. 

*Estudantes de Jornalismo da Universidade Federal Fluminense (UFF) sob coordenação da jornalista Larissa Morais.

Edição de Sabrina Lorenzi