No último dia 5, todos os coordenadores de fiscalização nas 27 unidades da federação do programa de aprendizagem do governo federal entregaram o cargo. A debandada foi uma resposta à medida provisória que mudou radicalmente as regras da iniciativa.
O grupo elaborou um estudo técnico mostrando que mais de 430 mil vagas poderão acabar devido às alterações da MP elaborada pelo governo federal. Em 2021, foram contratados 471.863 aprendizes
“Com essa MP o governo enfraquece drasticamente uma potente ferramenta de combate ao trabalho infantil”, afirma a auditora fiscal do trabalho Luciana Sans, uma das coordenadoras que entregou o cargo.
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A legislação brasileira permite trabalho para maiores de 16 anos. A ocupação de pessoas abaixo desta idade é considerada trabalho infantil, exceto no âmbito do programa Jovem Aprendiz, que estipula cotas de contratação de adolescentes a partir de 14 anos que variam entre 5% e 15% dos funcionários.
As mudanças acabam reduzindo as obrigações das empresas, limitam a fiscalização e reduzem o risco de multas, segundo o estudo.
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Pelas novas regras, um adolescente ou jovem em situação de vulnerabilidade social vale metade do que um outro em situação de não vulnerabilidade. Se uma empresa que precisa contratar 50 aprendizes em dois anos decidir que só empregará vulneráveis, vai contratar 25.
“A regra aparenta uma nobre motivação, mas, na verdade, tem um potencial de fechar até metade das vagas de aprendizes no mercado de trabalho … Na prática, ocorrerá que um adolescente/jovem/pessoa com deficiência deixará de ser contratado por uma empresa, pois o outro adolescente/jovem/pessoa com deficiência que foi contratado ocupará duas vagas”.
O público-alvo do programa jovem aprendiz já é voltado para a baixa renda. O salário pago é em média de R$ 600,00, portanto para pessoas de extrema vulnerabilidade, destacam os autores do estudo.
A polêmica MP 1.116/22 resgata medidas que já foram derrubadas em projetos apresentados anteriormente ao Congresso Nacional. Parlamentares se movimentam para derrubá-la.
“Não tem sentido enfraquecer um programa que funciona tão bem, por que reduzir algo que está funcionando?”, afirma o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), Bob Everson Carvalho Machado.
De acordo com os auditores, as mudanças resultam em uma “nova reforma trabalhista sobre cotas de aprendizagem”. Foram alterados mais de 86% dos artigos da Lei da Aprendizagem, Lei 10.097/2000, e mais de 64% dos artigos do decreto que a regulamentavam.
Foram concedidos ainda prazos para regularização da cota, com a proibição de auditoria fiscal de lavrar auto de infração por seu descumprimento. Também é criticada a redução da multa em 50% dos autos de infração lavrados antes da adesão ao projeto que reduz o prazo.
“Se a empresa que aderir ao PNIC resolver simplesmente não cumprir a promessa terá que arcar com valor de multa de R$ 3.000,00 por aprendiz não contratado, o que significa dizer que deixar de cumprir a promessa será cerca de 8 vezes mais barato que regularizar a cota”, considerando que cada aprendiz tem um gasto de R$ 24 mil durante o contrato de dois anos.