A falta de recomposição de matas ciliares e de filtragem do solo tem aumentado a concentração de substâncias tóxicas nas bacias hidrográficas que tiveram nesta semana a captação interrompida, deixando boa parte do Leste Fluminense sem previsão de receber água.

A  captação de água no sistema Imuna-Laranjal está interrompida desde quarta-feira porque foi constatada contaminação pelo produto químico cancerígeno tolueno que, entre várias aplicações, é utilizado na produção de pesticidas. O sistema é a única fonte de água de mais de dois milhões de pessoas, em Niterói, São Gonçalo e Itaboraí.

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A restauração florestal de cerca de 4300 mil hectares na região é uma das obrigações para mitigação de impacto ambiental do antigo Comperj, mas não foi cumprida. Sem a recomposição, o risco de concentração de qualquer rejeito tóxico, esgoto e poluentes aumentou consideravelmente nos últimos anos.

Esta obrigação, se cumprida, teria reduzido o nível de concentração de poluentes nos rios afetados, possivelmente evitando o problema que está acontecendo agora, segundo afirmou à Agência Nossa o superintendente do Ibama no estado do Rio de Janeiro.

“Um elemento importante que é a impermeabilização do solo nos 5 mil hectares onde está o Comperj, hoje Gaslub, tem efeito negativo (e nefasto) nos rios que abastecem a região (…) Esses rios (depois das obras) passaram a absorver mais esgoto e resíduos tóxicos de pastagens e produtos químicos de atividades agrícolas”, afirmou à Agência Nossa o superintendente do Ibama no Rio de Janeiro, Rogério Rocco.

Segundo ele, a substância poluente encontrada na água não vazou do Comperj, mas o empreendimento contribuiu para sua absorção maior pelos rios. “É possível que tenha sido de algum tipo de agrotóxico”, afirmou.

Para construir o que se tem hoje do Comperj, a Petrobras teve de impermeabilizar toda a área que circunda o complexo, para evitar qualquer chance de contaminação na região pela planta petroquímica. O empreendimento está localizado bem próximo aos rios que são a única fonte de abastecimento de nada mais nada menos que cerca de 3 milhões de habitantes.

Pelo sistema de impermeabilização, a água com rejeitos e substâncias tóxicas do Comperj/Gaslub retornam para dentro da planta, evitando assim vazamentos para a bacia hidrográfica da região.  Rocco explica que esta impermeabilização evita vazamentos graves da planta para os rios. Mas tem um impacto negativo, por outro lado.

“Toda aquela área que era permeável não é mais. Em vez de a água (do lado de fora do Comperj) se espalhar, ela vai para o rio. O risco de concentração de substâncias na água do rio aumentou”,  explicou o superintendente do Ibama, que até recentemente tratou da questão dos impactos do Comperj  no ICMBio da APA Guapimirim.

Entre as condicionantes do licenciamento ambiental do Comperj, está a restauração florestal de uma zona tampão de 2.308 hectares entre o GasLub e  duas unidades de conservação federais. A outra obrigação refere-se à restauração florestal de 2.014 hectares de matas ciliares nas bacias dos rios Guapi-Macacu e Caceribu, que atravessam a APA de Guapi-Mirim.

Ingadada sobre questões ambientais que envolvem o Gaslub na semana passada antes da interrupção do abastecimento de água, a Petrobras respondeu que não há “questões ambientais” pendentes, e que “todas as atividades no polo são respaldadas por licenças ambientais emitidas pelo INEA, órgão do governo estadual responsável pelo licenciamento do estado.

Pago mas não realizado

Rocco lembra que em 2019 a Petrobras propõs a monetização dessa obrigação. 

De fato, as licenças prévia e ambiental foram emitidas e a empresa informou às autoridades competentes os pagamentos acertados. Mas as mitigações de restauração ambiental não foram realizadas, segundo o Ibama. Segundo ele, o governo do estado ficou com o dinheiro mas não usou no cumprimento das próprias exigências que realizou.

“É uma esculhambação”, disparou. 

A Petrobras ainda precisa, contudo, da licença de operação para que o Gaslub comece a funcionar. “A Petrobras diz que pagou mas essa obrigação é dela e a obrigação precisa ser cumprida para a emissão desta licença de operação”, afirmou Rocco.

O governo do estado foi procurado mas até o fechamento da reportagem não respondeu às indagações da Agência Nossa.

Contaminação faz parte de um processo e não é pontual

“É certo que efeitos negativos da impermeabilização do Comperj/Gaslub contribuíram para esta concentração de resíduo tóxico. Matas ciliares recompostas poderiam ter filtrado boa parte desses rejeitos que causaram esta interrupção”, concluiu o superintendente do Ibama.

Reportagem atualizada no mesmo dia da publicação com mais informações da entrevista com Rogério Rocco.