“Você já se perguntou como seria ter uma ilha só para você? Água mineral natural e movida a energia solar, esta casa fica a metros do mar,com uma bela banheira com vista para o oceano e um imenso deck para observar golfinhos e o belo pôr do sol!”. Quem lê o anúncio da mansão no Airbnb pode até pensar que ilhas e praias no litoral paulista podem ser particulares.

“Casa em frente ao mar com piscina, churrasqueira, sauna e acesso a praia particular. Todo o conforto com alto padrão, espaço e privacidade que você precisa para uma viagem em família ou em amigos”. Este outro, de uma mansão na Ponta do Sapê, Angra dos Reis (RJ) é um dos muitos que revelam, a rigor, uma prática ilegal.

Anúncio oferece praia particular para hóspedes

A Constituição Federal prevê que as praias são bens da União, “bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os trechos considerados de interesse de segurança nacional ou incluídos em áreas protegidas por legislação específica”.

Muros altíssimos impedindo a visão da praia, condomínios privados que bloqueiam ou atrapalham o acesso à areia. Muito comum no litoral paulista, baiano, fluminense, em muitas cidades brasileiras, inclusive Niterói.

Podemos ver a obstrução na estrada Fróes, no lado esquerdo da praia de Itacoatiara, próximo ao clube Pampo. Alguns trechos em Jurujuba também. Imagine se não fosse bem público, o que seria do acesso às praias pela população.

Assine a Volver! para receber gratuitamente nossas reportagens 

Quem compra ilhas ou terrenos à beira de praias pode usufruí-los sem, contudo, proibir acesso à população. Barracas e quiosques que vendem comes e bebes por exemplo também não podem restringir a permanência de pessoas em seus locais, porque o acesso a todos é garantido por lei. Ao menos por enquanto.

Sim, por enquanto. Parece inacreditável, mas uma PEC que abre caminho para a privatização das praias brasileiras já foi aprovada na Câmara dos Deputados e voltou nesta semana a ser discutida por parlamentares, no Senado. A PEC é de autoria do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).

Trecho de Itacoatiara, em Niterói, tem muros altos que impedem a visão da praia.

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2022 transfere a propriedade dos terrenos do litoral brasileiro, hoje sob o domínio da União, para estados, municípios e proprietários privados. Aprovado em fevereiro de 2022 na Câmara dos Deputados, a PEC estava parada na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.

Uma audiência pública discute hoje o tema, que está sob a relatoria do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e enfrenta resistência da base governista. Organizações ambientalistas alertam que a proposta traz o risco de privatização das praias por empreendimentos privados e pode comprometer a biodiversidade do litoral brasileiro.

“Esse é mais um projeto do Pacote da Destruição prestes a ser votado. Isso põe em risco todo o nosso litoral, a segurança nacional, a economia das comunidades costeiras e nossa adaptação às mudanças climáticas”, afirma o Observatório do Clima.

Em Angra dos Reis, algumas praias foram de fato fechadas ao público, e só foram reabertas mediante protesto. Casos como os das praias da Figueira e Bica.

Projetos de condomínios de luxo preocupam em Camboinhas, mesmo sem a PEC. Com essa possibilidade de privatização, a transferência das praias niteroienses para a Prefeitura, governantes poderiam fazer o que  bem entendessem. A conferir os próximos capítulos desta PEC.