O Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU publicou nesta terça-feira uma mensagem condenando a operação policial que deixou 64 mortos no Rio de Janeiro.
Foi a maior ação policial do estado, com 2,5 mil policiais civis e militares mobilizados para atuar nos complexos do Alemão e da Penha, com objetivo de capturar lideranças criminosas e conter a expansão territorial do Comando Vermelho.
“Esta operação mortal reforça a tendência de consequências letais extremas das operações policiais nas comunidades marginalizadas do Brasil. Lembramos às autoridades suas obrigações sob o direito internacional dos direitos humanos e pedimos investigações rápidas e eficazes”, afirma a nota, publicada na rede social X.
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A Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União encaminharam ofício ao governador Cláudio Castro solicitando que “informe detalhadamente de que forma o direito à segurança pública foi promovido” na megaoperação.
Em retaliação ao cerco policial, criminosos usaram dezenas de ônibus que sequestraram como barricadas, ordenaram o fechamento do comércio em diversas áreas da cidade e jogaram bombas a partir de drones.
Em fuga pela parte alta da comunidade do Alemão, suspeitos teriam sido encurralados na trilha, onde teria sido o ponto mais letal da operação.

© Fernando Frazão/Agência Brasil
O MPF também quer saber se foram cumpridas as exigências do Supremo Tribunal Federal (STF) descritas na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, conhecido como “ADPF das Favelas”, que estabeleceu parâmetros para a elaboração do plano de redução da letalidade policial apresentado pelo Estado do Rio de Janeiro à corte.
O ofício enviado ao governador requer que o governador apresente “documentação comprobatória” de que acatou as determinações do STF para redução de letalidade policial. Entre as quais a definição prévia do grau de força adequado; atuação de órgãos periciais para identificação de vestígios de crimes e o uso de câmeras corporais.
A Comissão de Direitos Humanos e Assistência Judiciária da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Estado do Rio de Janeiro,repudiou a megaoperação.
“Embora se reconheça a necessidade da atuação firme, diligente e coordenada do Estado na preservação da ordem pública, conforme dispõe o artigo 144 da Constituição da República de 1988, não se pode admitir que tais operações se desenvolvam de forma a colocar em risco a vida, a integridade e as liberdades fundamentais da população carioca e fluminense, como lamentavelmente se verificou, com restrições arbitrárias ao direito de circulação e ao livre exercício das atividades cotidianas”.

© Fernando Frazão/Agência Brasil
Além do número de mortes sem precedentes, a “Operação Contenção” parou a cidade, com efeitos em municípios vizinhos como Niterói. Empresas de ônibus retiraram veículos de circulação por segurança, deixando trabalhadores de toda a cidade sem transporte para voltar do trabalho. Comércio e empresas pararam e dispensaram funcionários, que voltavam a pé para suas casas. Estações de metrô e barcas ficaram superlotadas durante toda a tarde.
O presidente da ONG Rio de Paz, Antônio Carlos Costa, afirmou que a ação, segundo ele batizada de “operação suicida” entre os próprios policiais, é desconectada com qualquer projeto de segurança pública pactuado com a sociedade, sem transparência.
Os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Ricardo Lewandowski (Justiça e Segurança Pública) farão uma reunião de emergência com o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, nesta quarta-feira (30).
Para especialistas ouvidos pela Agência Brasil, a operação gerou um grande impacto na capital fluminense e não atingiu o objetivo de conter o crime organizado. “Essa lógica de medir força armada bélica com estruturas do tráfico sempre resultaram em mortes cada vez maiores, em sofrimento cada vez mais intenso, perda de acesso a serviços públicos, perda de mobilidade urbana, os mais frágeis sempre vão sofrer muito mais. A economia é afetada diretamente e o problema nunca foi sequer arranhado”, disse ao veículo o professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), José Cláudio Souza Alves.