Com a busca por fontes renováveis de energia e novas tecnologias, a amônia verde se tornou um dos produtos mais promissores para a descarbonização devido a sua aplicabilidade em diversas áreas, como fertilizante e combustível marítimo. Mas, seja ela verde ou não, a amônia é tóxica e o nitrato de amônio, que é um de seus produtos, tem potencial altamente explosivo. Com a maior demanda pelo produto também aumenta a necessidade de prevenção de acidentes em seu armazenamento – e o Brasil não possui regras para isso.

“O Brasil não tem legislação específica sobre armazenamento de nitrato de amônio”, afirma o Gerente de Projetos da Gerolin Engenharia, Felipe Capucci. Muitos projetos de engenharia seguem normativas do Corpo de Bombeiros. Leis direcionadas tratam de armazenamento de componentes químicos de modo geral, acabam sendo abrangentes, nem sempre levando em consideração que a origem do fogo influencia diferentes formas de combate – nem todo incêndio deve ser combatido com água, por exemplo. A falta de leis bem elaboradas e específicas pode levar a sistemas que não são pensados para cada situação e minimizar o combate ao acidente.

Assine a Volver! para receber gratuitamente nossas reportagens

Normas internacionais podem servir de base, como a NFPA 400 – Hazardous Materials Code, Capítulo 11 – Nitrato de Amônia Sólida e Líquida, subitem 11.2.6 – Sistemas de Proteção contra Incêndio. A norma delimita exigências para o estoque de nitrato de amônio, como um sistema automático de sprinklers, extintores na área de carga/descarga e na área de estocagem, e hidrantes. As exigências brasileiras atuais são menos específicas.

Devido o potencial explosivo, o nitrato de amônio é controlado pelo Ministério do Exército. “Uma sugestão seria ter o Exército fiscalizando o armazenamento da substância, evitando potenciais riscos”, opina o gerente de projetos da Gerolin. “A melhor forma de combater acidentes é aprimorar os projetos de engenharia pensando em prevenção, em estruturas que não comprimam o material, e estruturar formas de combater em caso de incêndio”, completa o especialista.

Um caso recente que ilustra o perigo da amônia foi o de Beirute, em 2020. A cidade libanesa tinha sofrido com uma mega explosão na zona portuária. O armazém continha mais de duas mil toneladas de nitrato de amônio sem medidas de segurança. “Beirute já é uma região quente, e com o armazenamento em espaço confinado com outros materiais (havia um estoque de fogos de artifício no local), isso se tornou um risco de explosão”, destaca Capucci.

Foto: Reprodução

 

“Há desconhecimento do perigo dessa substância”, comenta Felipe Capucci, Gerente de Projetos da Gerolin Engenharia. “Quando aquecido, o nitrato de amônio entra em decomposição liberando nitrogênio, oxigênio e água, que se expandem e podem produzir uma onda de choque, ampliando a área de impacto. O nitrato de amônio se decompõe muito rápido”, complementa. 

O efeito explosivo do nitrato de amônio criou uma onda de choque que impactou prédios da região, causando a morte de aproximadamente 100 pessoas e milhares de feridos. O acontecido trouxe um alerta mundial sobre a responsabilidade no cuidado com a substância. Seu armazenamento precisa ser seguro e seguir algumas regras. Por si só, não é um componente com risco de explosão, mas se exposto a calor ou misturado a outros materiais – e quando armazenado em grandes quantidades – pode ser fatal.

A amônia é utilizada principalmente como fertilizante, mas tem potencial para se tornar uma tecnologia vista como viável até para combustível como de navios, caldeiras, turbinas ou motores. 

De acordo com Felipe Capucci, a utilização da amônia verde como combustível marítimo descarbonizado, é essencial. ”Hoje a gente não tem outra possibilidade de substituição de combustível de navio, sem ser a amônia verde”, relatou Capucci.

A Organização Internacional Marítima (IMO) estabeleceu a meta de diminuir entre 20% e 30% das emissões de gases de efeito estufa (GEE) até 2030 e de 70% a 80%, até 2040. Para isso, estuda o uso de combustíveis como a amônia verde. 

Potencial substituta para descarbonização

A amônia (NH3) é um composto químico de nitrogênio (N) + hidrogênio (H) e é chamada de verde quando, em sua produção, são utilizadas fontes renováveis (como o hidrogênio verde), que são livres da emissão de CO2. A sua utilização pouparia 40 milhões de toneladas de CO2 por ano, só na Europa, de acordo com uma pesquisa realizada pela empresa Siemens Energy.

Atualmente, as indústrias de fertilizantes ainda optam por utilizar a amônia cinza (que emite CO2) por ser menos custosa do que a verde, mas com a necessidade, passaram a investir em fertilizantes biológicos que também diminuem a emissão. 

Para Felipe Capucci isso é um sinal de mudança no mercado: “Os pesquisadores que já faziam esse trabalho na década de 80, agora encontraram investidores, justamente porque existe essa vontade do mercado. E ela não surge sozinha, ela precisa de eventos como a COP 28 para estimular”, relatou o gerente, que continuou: “Quanto mais restritivo fica o mercado, novas tecnologias vão surgindo”.

Os mesmos riscos 

Os riscos para os tipos de amônia (que emitem ou não CO2) são os mesmos, porque é o mesmo produto químico. Ela é usada como gás na indústria, os problemas que se tem são justamente os vazamentos. 

Foto: Reprodução

“O que causam eles são, normalmente, uma variação grande no sistema de pressurização, que pode acontecer devido uma falha de manutenção, no equipamento, surto de energia, acidentes que geram algum vazamento na rede e, o que acontece na maioria dos casos, a má manutenção das tubulações”, ressaltou o gerente. No final de 2023 aconteceram dois casos de vazamento de amônia em dois frigoríficos da JBS, conforme o site Sidrolândia News, ambos aconteceram em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, totalizando o atendimento de 14 funcionários que tiveram mal-súbito, mesmo após um rápido atendimento.