Mais uma vez as big techs estão conseguindo travar uma importante regulamentação no setor, deixando o Brasil para trás dos demais países que já adotam regras para inteligência artificial, inclusive Estados Unidos e China. Representantes do governo federal e especialistas em comunicação reunidos no G20 Social avaliam que a regulação é fundamental para garantir direitos humanos e temem que a pauta tenha o mesmo desfecho do PL das Fake News – empacado no Congresso Nacional.

O secretário de Políticas Digitais da Secretaria de Comunicação da Presidência, João Brant, afirmou a importância da aprovação do Projeto de lei 2.338, apresentado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que sinalizou interesse em votar o texto, ainda neste ano. 

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“O PL é positivo desde que estejam preservadas as questões de garantias de direitos e o equilíbrio entre essa dimensão de competitividade e garantia de direitos. Em princípio, o governo está favorável e trabalhando junto com o relator para impulsionar o projeto”, afirmou o secretário.

Palestrantes e ouvintes da mesa sobre os impactos da IA, no G20 Social. Foto: Agência Nossa

A proposta tramita em conjunto com outras nove proposições, que estabelecem um arcabouço legal para o desenvolvimento e uso da IA no Brasil. As discussões se arrastam desde meados do ano passado e nos últimos meses passaram a sofrer mais pressão da indústria.

A professora da Universidade Federal do Ceará e integrante do Direito à Comunicação e Democracia (Diracom), Helena Martins, disse que é preciso escolher “se a gente quer avançar para definir para que a tecnologia, qual a tecnologia e como ela vai se inserir na sociedade ou se a gente quer seguir sendo um espaço para coleta de dados das big techs e para a violação de direitos humanos em última instância. A nosso ver, é fundamental a gente ter a regulação”.

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A especialista lembrou do lobby das empresas de tecnologia para atrapalhar a regulamentação das redes sociais prevista no PL das Fake News, que estacionou no Congresso. “Mais uma vez este lobby está afetando o processo”.

Uma proposta de substitutivo com significativas alterações em favor da indústria ameaça o teor de regulação do projeto. O novo texto informal retira por exemplo a avaliação de impacto dos algoritmos, entre outras medidas de transparência para uso de IA. 

Para Admirson Medeiros Ferro Junior, coordenador do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação e representante do fórum no Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), a inteligência artificial precisa, como qualquer outra tecnologia, ser regulada para proteger a sociedade, os direitos humanos e preservar as integridades de informação. “O CNDH está propondo encaminhamentos para regulação da inteligência artificial no Brasil”, disse, na mesa do G20 Social proposta pela entidade.

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A representante do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), Aisha Sayuri da Rocha, disse que as tecnologias de inteligência artificial que não puderem ser operadas de acordo com os direitos humanos internacionais devem ser banidas ou suspensas até que as salvaguardas adequadas existam.

O diretor para América Latina da Reporteres sem Fronteiras, Artur Romeo, lembrou da tática das big techs para enfraquecer propostas de regulação, entre as quais o argumento da censura, na esteira do discurso da extrema direita.

Os participantes da mesa analisaram ainda os impactos da falta de regulação para o jornalismo e o acirramento da desinformação. O secretário da Secom ressaltou que o projeto precisa contemplar ainda que os setores de produção de conteúdo jornalístico, artística, científica não tenham seu modelo de remuneração prejudicado em razão da inteligência artificial.