Enquanto delegações, organizações, setores público e privado começavam a se movimentar para a Conferência do Clima na Amazônia, a única refinaria da região desmatava uma Área de Preservação Permanente (APP) no coração da floresta.
A Refinaria de Manaus (Ream) conseguiu autorização do órgão ambiental estadual em novembro de 2024 para a manutenção da via de acesso interno da refinaria. A mesma autorização, contudo, informa que seria “expressamente proibida a supressão vegetal e intervenção em área de preservação permanente” sem a devida autorização do órgão para este fim.
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Em seguida, em dezembro de 2024, a empresa conseguiu outra autorização do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) para supostas obras necessárias à estabilização de taludes e prevenção desmoronamentos que poderiam causar rompimento de tubulações de combustíveis com consequentes danos ambientais.
Imagens registradas por funcionários durante as obras revelaram, entretanto, que a empresa desmatou uma vasta área incluída em uma APP ao lado da via alvo da primeira autorização, fora portanto dos limites apontados na licença do órgão ambiental.

As coordenadas registradas nas imagens de desmatamento também não equivalem aos trechos autorizados para obras de prevenção de acidentes pelo Ipaam.
Uma fonte com conhecimento do assunto afirmou à Agência Nossa que o objetivo da empresa era expandir sua área de operação. Para isso seria necessário suprimir a vegetação. Procurada pela Agência Nossa, a Ream não se manifestou.
A empresa derrubou buritizeiros (Mauritia flexuosa), açaizeiros (Euterpe oleracea), vitórias régias (Victoria amazonica) entre todas as outras espécies nativas de uma densa floresta de várzea, com igarapés e terrenos úmidos num total de 4 mil m2 até o momento do registro das imagens.

Denúncias do Sindicato dos Petroleiros ao órgão ambiental confirmaram que a área, incluída em uma APP, não apresentava riscos e que a atividade de desmatamento não se relacionava a medidas de prevenção de desastres ou à proteção de infraestruturas críticas.
“Trata-se de uma intervenção que aparenta ser realizada sem qualquer justificativa técnica plausível, resultando em danos desnecessários ao meio ambiente”.
Segundo a denúncia, o Ipaam pode ter sido induzido a erro devido à informação de localização equivocada das atividades realizadas pela Refinaria de Manaus.
“As informações fornecidas pela Ream sobre a necessidade de estabilização de taludes não condizem com a situação real da área afetada, que não apresenta riscos de desmoronamento nem tubulações vulneráveis na região observada”, afirma a denúncia.
Multa de R$ 500 mil pelo Ipaam
Procurado pela Agência Nossa, o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) confirmou as informações e revelou que puniu a Ream pelas infrações.
O órgão realizou fiscalização na Refinaria de Manaus, em janeiro de 2025, após receber denúncia sobre supressão de vegetação e movimentação de solo em área da empresa.
“Durante a inspeção, a equipe técnica verificou que as atividades em andamento extrapolavam os limites da autorização concedida para manutenção da via de acesso interno da refinaria, abrangendo serviços de terraplanagem e movimentação de solo não licenciados”.
Veja aqui as autorizações do Ipaam:
27645_2024_22-144_2024-REFINARIA_DE_MANAUS_S_A
003204_2023_54-128_2024-REFINARIA_DE_MANAUS_S_A
O Ipaam lavrou auto de infração no valor de R$ 500 mil e emitiu termo de embargo e interdição da área onde estavam sendo executadas as intervenções.
Até o final de agosto, o Ipaam ainda estudava medidas administrativas e cabíveis em relação à refinaria. O relatório técnico de fiscalização foi encaminhado às diretorias competentes do Instituto para análise e adoção de respectivas providências considerando que desmatar APP pode ser considerado crime ambiental.
Neste caso, no qual houve aparente distorção de informações ao órgão ambiental, o caso se agrava, segundo a fonte que falou à Agência Nossa.
Histórico conturbado desde a privatização
Privatizada pelo governo Bolsonaro, a Ream, antes Reman, era controlada pela Petrobras e funcionava a gás natural. Com a compra pelo grupo Atem, que domina uma série de atividades na região, inclusive atuando na distribuição de combustíveis, a refinaria passou a funcionar com óleo combustível, mais barato, porém 40% mais poluente segundo o Iema. O gás natural que a abastecia vinha de campos de gás natural da própria Petrobras e depois da privatização parou de ser fornecido.
A refinaria, única da região Norte, também é apontada como causa do aumento de preços de combustíveis. O Norte do País passou a ter os preços mais elevados de gasolina depois que foi vendida para a iniciativa privada.
Em outra polêmica, a refinaria de Manaus está ameaçada de perder sua autorização para funcionar. A empresa está na mira da Agência Nacional do Petróleo (ANP) porque interrompeu suas operações de refino há mais de um ano. A reguladora afirma que está operando como formuladora, o que pode explicar os ganhos financeiros apesar da interrupção de suas operações de refino.
 
						