A votação do projeto de lei das fake news foi adiada após ataques realizados ao longo da última semana pelas próprias big techs contra o PL. Os três poderes da República agiram para conter a propagação de conteúdos suspeitos de desinformação pelas empresas de tecnologia, mas o estrago já havia sido feito e o projeto, enfraquecido.
O ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, no mesmo despacho em que determinou a remoção de conteúdos com ataques ao PL 2630 pelo Google, Meta, Spotify e Brasil Paralelo, acabou, na prática, antecipando algumas medidas propostas pelo projeto de lei.
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Relator do inquérito das Fake News no STF, Moraes deu prazo de 48 horas para que as empresas citadas informem por meio de documentos quais as providências “reais e concretas” realizam para prevenir, mitigar e retirar práticas ilícitas bem como o que fazem pelo combate à desinformação de conteúdos gerados por terceiros.
“Principalmente aqueles direcionados por algoritmos, impulsionados e que gerem publicidade cuja distribuição tenha sido realizada mediante pagamento ao provedor de redes sociais ou por contas inautênticas e redes de distribuição artificial…”.
Os alvos da determinação do ministro no despacho desta terça-feira também estão na mira do PL, a elencar:
condutas que incentivam atos antidemocráticos;
divulgação ou compartilhamento de mentiras ou fatos gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral;
grave ameaça, direta e imediata, de violência ou incitação à violência contra a integridade física de funcionários públicos ou contra a infraestrutura física do Estado;
comportamento ou discurso de ódio, inclusive promoção de racismo, homofobia, ideologias nazistas, fascistas ou odiosas contra uma pessoa ou grupo;
atos de terrorismo e preparatórios de terrorismo;
crimes contra crianças e adolescentes e
violência contra a mulher.
Ajor defende PL
O PL 22630 também estabelece que as plataformas apresentem e mantenham normas transparentes para distribuição de conteúdos, ficando claros critérios adotados para seus algoritmos. Propõe que plataformas sejam responsabilizadas por propagação de notícias falsas e desinformação, bem como atribui a tais empresas o dever de ações de prevenção contra conteúdos de caráter nazista, fascista, racista e contra o estado democrático de direito. Outra proposta no PL é a remuneração pela veiculação de conteúdo jornalístico, como já é realizado em outros países.
Associações de veículos de jornalismo, como A Ajor, da qual a Agência Nossa faz parte, apoiam o PL. — “diante dos efeitos dramáticos da desinformação e do discurso de ódio”.
Os veículos defendem a valorização do jornalismo como antídoto a essa epidemia social. “O jornalismo de interesse público é a principal arma da sociedade para combater a desinformação e um importante instrumento para o exercício do direito de acesso à informação”, diz a Ajor.
A votação de urgência do governo para atribuir às big techs a responsabilidade pelo combate à desinformação fracassou diante de munição pesada de grandes empresas de tecnologia. O Google, que manteve em sua página um link para textos atacando o projeto.
“Num país com o mínimo de seriedade, Google, Instagram, TikTok, todos os meios tinham que ser responsabilizados. Como você tem num site de pesquisa um tratamento desonroso com essa Casa?”, disse o presidente da casa Arthur Lira, enquanto Morais determinou que as plataformas expliquem os métodos, algorítimos de impulsionamento e “induzimento à busca sobre “PL da Censura”.
“Conduta de big techs guarda conexão total com inquérto de fake news”
No despacho que ordena a retirada dos conteúdos contra o PL pelas plataformas, Moraes afirma que a conduta de algumas grandes empresas de tecnologia “guardam total conexão” com o inquérito das fake news.
O objeto do inquérito, lembra o ministro na peça, é a investigação de notícias fraudulentas (fake news), falsas comunicações de crimes e denunciações caluniosas, entre outros pontos,, inclusive ameaças que atingem a segurança do STF.
“Os provedores de redes sociais e de serviços de mensageria privada não devem ter nem mais, nem menos responsabilidade do que os demais meios de mídia, comunicação e publicidade, principalmente, quando direcionam ou monetizam os dados, informações e notícias veiculadas em suas plataformas”, e completa, em letras garrafais que as redes sociais não são terra sem lei e também não são terra de ninguém.
Editorial ou publicidade?
Mais cedo, o Ministério da Justiça e Segurança Pública informou a imposição de medida cautelar contra o Google Brasil. O termo exigia a modificação, em até duas horas, da página inicial da plataforma e da forma que a empresa vinha expondo informações sobre o PL.
A medida foi tomada após o Google publicar na sua página de busca o texto “O PL das fake news pode aumentar a confusão sobre o que é verdade ou mentira no Brasil”.
“Isso é o quê juridicamente? Um editorial? Mas eles dizem que não são empresa de comunicação. Se é uma plataforma de tecnologia, é publicidade. Se é publicidade, tem de estar sinalizado como tal para que os consumidores saibam que é publicidade de uma empresa”, alegou Flávio Dino.
A empresa retirou a frase do buscador no início da tarde desta terça-feira, após a reação contrária das autoridades.
Levantamento do NetLab, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) mostrou que, os links do Google contra o PL também apareceram na primeira página resultado da busca orgânica pelo termo “PL 2630”, em consultas realizadas de forma anônima, sugerindo um usuário genérico brasileiro sem histórico, entre os dias 23 e 28 de abri. O levantamento foi noticiado pelo jornal Folha de São Paulo, que também reuniu e-mails e relatório sobre a ofensiva do Google ao projeto de lei. Moraes dá início ao despacho citando o estudo e a reportagem da Folha.
Texto atualizado com mais informações sobre o despacho do ministro do STF