Dois anos após a tragédia que vitimou 272 pessoas em Brumadinho, governo de Minas e Vale selaram acordo de R$ 37 bilhões por ressarcimento dos danos. Trata-se do maior acordo já firmado na América Latina com participação do Poder Público, segundo o governo mineiro.
O governador Romeu Zema reforçou que o termo não retira nenhuma responsabilidade da mineradora, mas impõe novas obrigações, além de ser um reconhecimento da responsabilidade da mineradora. A assinatura desse termo, segundo ele, não prejudica as ações individuais por indenizações e criminais, que seguem tramitando normalmente.
Apesar da celebração das autoridades envolvidas, a associação que representa as vítimas e o prefeito da cidade impactada reclamaram de falta de participação no acordo, o que foi rebatido pelo governador..
“Tivemos 11.800 atendimentos a pessoas que foram atingidas – segundo a Defensoria Pública -, mais de 8.000 acordos individuais. Muita coisa já foi feita e continua sendo feita além desse acordo. Outro ponto é em relação ao valor. Nunca no Brasil se fez um acordo dessa magnitude”, afirmou o governador.
Vinte mil pessoas na mira das barragens da Vale
Os recursos serão usados no programa de transferência de renda para os moradores das regiões atingidas, no atendimento da demanda direta dos atingidos, em investimentos socioeconômicos na Bacia do Paraopeba, na reparação socioambiental, na segurança hídrica da região metropolitana de Belo Horizonte, em projetos de mobilidade na região metropolitana da capital e na melhoria de serviços públicos no estado.
O acordo prevê que 30% dos recursos beneficiem o município e a população de Brumadinho.
“Nós estamos usando esta indenização para o povo mineiro e não para o caixa do Estado. Continuaremos sendo um Estado com terríveis dificuldades financeiras, mas o povo mineiro vai receber o legado. São obras que significarão um legado para 21 milhões de mineiros. Este recurso está sendo destinado aos mineiros que foram afetados por essa tragédia, que não só nos entristeceu muito, mas fez com que a atividade econômica fosse seriamente afetada. E iniciamos agora um novo desafio, de darmos início a essas obras que vão gerar 360 mil empregos nos próximos meses e anos”, disse o governador Romeu Zema.
Do total, R$ 3 bilhões irão para as comunidades atingidas e R$ 6,1 bilhões destinados ao pagamento emergencial já efetuado e ao programa de transferência de renda, ambos com o objetivo de trazer de volta as condições de vida dos atingidos.
Aproximadamente R$ 4,7 bilhões irão para Brumadinho e outros municípios da Bacia do Paraopeba; R$ 2,05 bilhões a obras para aumento da resiliência e interligação do sistema Paraopeba e Velhas; R$ 6,55 bilhões para intervenções de recuperação do meio ambiente e compensação dos danos que foram considerados irreversíveis.
E R$ 15 bilhões serão destinados à melhoria da infraestrutura e dos serviços públicos, geração de emprego e renda e reparações em Minas Gerais.
Associação de vítimas reage
A Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos do Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão – Brumadinho (AVABRUM) afirmou que espera que o dinheiro do acordo seja destinado a melhorias e bem-estar para os municípios “verdadeiramente impactados”.
A organização reclama que não foi ouvida e consultada, não sendo possível expressar uma opinião a respeito do tratado.
Apesar do valor ser um dos mais altos já estipulados, ele ficou R$ 17 bilhões abaixo do valor inicial pedido pelos danos, que era de R$ 54 bilhões. Sobre a definição do valor, o terceiro vice-presidente do TJMG, Nilton Teixeira, explicou que para ajuizar uma ação é preciso ter um valor, mas que o pedido não corresponde sempre ao realmente devido.
“Foi isso que aconteceu. Não tínhamos um valor fechado, fixo. Ele estava em construção. A Vale, no primeiro momento, reconheceu o pedido. Em um segundo momento, passamos para o levantamento dos valores. Este valor de R$ 37 bilhões que foi discutido entre as partes é um valor racional e está devidamente justificado nos diversos anexos. Não adianta falar em R$ 54 bilhões se ele não se justifica”, disse.
O procurador-geral da República, Augusto Aras, disse, durante seu pronunciamento, que o Poder Público resolveu grandes questões sociais, econômicas e ambientais. “Eu diria que essas soluções não desprezaram a vida daqueles que se foram para mitigar a dor dos que ficaram, mas propiciam a reparação dos danos e a recomposição desses bens coletivos”, explicou.
Prefeitura de Brumadinho pede investimentos
O Prefeito de Brumadinho, Nenen da Asa, se reuniu hoje (4/2) com o Secretário de Estado de Infraestrutura e Mobilidade de Minas Gerais, Fernando Marcato, para garantir que pelo menos 30% dos recursos do acordo entre a Vale e o estado vá para Brumadinho.
“Esse é um acordo que foi feito sem a participação de Brumadinho, mas com uma tragédia que aconteceu aqui. Então é justo que os investimentos do Estado sejam feitos aqui”, disse.
Nenen disse que o Secretário se propôs a ir a Brumadinho para que os projetos sejam discutidos em conjunto. O encontro deve acontecer depois do carnaval.
Vale celebra
A Vale também se posicionou nesta quinta-feira (4/2) a respeito do acordo selado a fim de reparar integralmente o município de Brumadinho e a apoiar o desenvolvimento do Estado de Minas Gerais.
O diretor-presidente da Vale, Eduardo Bartolomeo, falou sobre o compromisso de atuar em projetos de reparação socioeconômica e socioambiental.
“A Vale está determinada a reparar integralmente e compensar os danos causados pela tragédia de Brumadinho e a contribuir, cada vez mais, para melhoria e desenvolvimento das comunidades em que atuamos. Confiamos que este acordo global é um passo importante nessa direção. Sabemos que temos um caminho a percorrer e seguimos firmes em nosso propósito, alinhado com nosso Novo Pacto com a Sociedade”, afirma Eduardo Bartolomeo.
Na nota, publicada no site da empresa, Marcelo Klein, diretor especial de Reparação e Desenvolvimento da Vale, também comentou sobre o ressarcimento prometido na decisão publicada.
“O compromisso da Vale é promover uma reparação integral dos danos causados pelo rompimento da Barragem B-1. Nesse sentido, o acordo contempla inúmeras medidas de reparação, desde ações para atenuar o sofrimento das pessoas e comunidades, até projetos para fomento econômico da região e melhoria da infraestrutura. Muitas iniciativas continuarão a ser implementadas pela própria Vale, enquanto outras ficarão a cargo do Estado e suas instituições, com recursos providos pela Vale. Reconhecemos nossa responsabilidade e compromisso com reparação integral, de forma solidária com as pessoas, famílias, comunidades e territórios atingidos”, reitera Marcelo Klein.
O acordo prevê ainda o encerramento das discussões judiciais referentes aos danos socioambientais causados pelo rompimento, assim como os relativos à reparação socioeconômica referente aos danos coletivos lato sensu e individuais homogêneos não divisíveis.Não fazem parte deste acordo as indenizações por danos individuais divisíveis.
“O processo de mediação conduzido pelo Tribunal de Justiça de MG permitiu a construção de um acordo que encerra, de forma definitiva, os litígios com o Estado de MG, Ministério Público Federal e Estadual, e Defensoria Pública de MG. As instituições que participaram da construção do acordo asseguraram soluções céleres, justas e eficazes num processo conduzido com transparência, legitimidade e segurança jurídica”, declara Alexandre D’Ambrosio, diretor jurídico da Vale.
Reportagem de Lara Barsi; edição de Sabrina Lorenzi