Pela primeira vez, o governo brasileiro lançou no mercado financeiro internacional títulos da dívida externa com critérios sustentáveis. Os chamados títulos verdes foram bem recebidos pelos investidores internacionais e a resposta positiva reforça a confiança na viabilidade e no potencial de crescimento de iniciativas sustentáveis no Brasil, segundo analistas.
Algumas ponderações sobre o programa, porém, foram feitas por uma equipe de especialistas com o objetivo de aprimorar a iniciativa. Em conformidade com os padrões de mercado para a emissão de títulos sustentáveis e seguindo as indicações da International Capital Markets Association – ICMA, o governo brasileiro submeteu o processo a avaliações da empresa especializada Morningstar Sustainalytics.
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Entre as ponderações, examinadas pela Agência Nossa, o grupo alerta para a possibilidade de uso de fertilizantes, que pode colocar em questão quão verdes serão os títulos.
Os títulos incluem projetos com uso de fertilizantes a base de hidrogênio verde, o que é bem recebido por especialistas e pela consultoria. Mas a Sustainalytics observa que a possibilidade de financiar fertilizantes convencionais pode trazer impactos danosos ao meio ambiente.
A consultoria lembra que essa prática não é sustentável a longo prazo e representa um sério desafio para a preservação dos ecossistemas aquáticos.
“A eutrofização resultante da lixiviação excessiva de nutrientes pode levar à degradação da qualidade da água, tornando-a inadequada para o consumo humano e prejudicando a vida aquática. Além disso, a redução no oxigênio disponível para outros orga”ismos aquáticos afeta negativamente a biodiversidade e a saúde geral dos ambientes hídricos”.
Os especialistas orientam que o governo, em consonância com seus objetivos de sustentabilidade, adote práticas agrícolas e estratégias de fertilização que sejam ambientalmente responsáveis. “Isso inclui a promoção do uso de fertilizantes de baixo impacto ambiental, a implementação de técnicas de agricultura sustentável e o estabelecimento de diretrizes rigorosas para a gestão adequada desses insumos”.
“Sem aplicação direcionada ou precisa, esses fertilizantes estão associados a impactos negativos a jusante, incluindo emissões de GEE, lixiviação do solo e escoamento para os ecossistemas locais”, disse a equipe de análise da Sustainalytics.
Procurado por esta reportagem, o Ministério da Fazenda, afirmou à Agência Nossa que o parecer da Sustainalytics deixa claro no trecho “No entanto, a Sustainalytics reconhece que a produção de fertilizantes utilizando hidrogênio verde é substancialmente menos intensiva em carbono do que a produção utilizando combustíveis fósseis equivalentes. Além disso, o Arcabouço exclui despesas associadas a inovações tecnológicas com utilização intensiva de carbono”, que os benefícios da produção de fertilizantes utilizando hidrogênio verde são significativos.
Mas a assessoria da pasta do ministro Fernando Haddad continua: “Sobre o financiamento da produção de adubos nitrogenados, sugerimos direcionar sua demanda para as instituições financeiras que operam o crédito rural”.
O fato é que o próprio mercado financeiro exige garantias que demandam inclusive o uso de pesticidas, dando ao produtor rural poucas alternativas para tomar crédito sem usar fertilizantes. Pois o uso de fertilizantes dá mais segurança de colheita segundo a agricultura convencional. Esses argumentos, porém, estão ultrapassados e a urgência de um planeta sustentável pressiona por mudanças no estabelecimento de garantias financeiras.
O problema do financiamento a agrotóxicos em detrimento aos cultivos baseados na agroecologias foi exposto por reportagem da Agência Nossa, a partir de dados do Banco Central.
Procurada, a Febraban, que representa os bancos, não comentou a resposta do Ministério da Fazenda até a atualização desta reportagem.
Eficiência energética
O documento da “segunda opinião“ menciona ainda que os projetos que visam melhorar a eficiência energética em edifícios existentes podem incluir atividades como isolamento térmico e instalação de sistemas de ar condicionado eficientes em termos energéticos. Essas medidas têm o objetivo de alcançar uma melhoria de pelo menos 20% no desempenho energético dos edifícios em relação a uma linha de base anterior à reforma.
Investidores preocupados com sustentabilidade receberam com entusiasmo a iniciativa, como bem descreve a sócia da Semeare Investimentos, Carolina Volcov.
“A iniciativa privada e o governo para atender entre as necessidades reais e do Pacto Global da ONU, têm feito os melhores esforços para estar em conformidade com as diretrizes ESG/ASG (Eviroment, Social and Governance em inglês e Ambiental, Social e Governança em português). Além disso, é bom lembrar que os títulos públicos são a forma como a instituição Governo emite dívida para cumprir sua responsabilidade com a nação do Welfare State – estado de bem-estar social – mensurado pelo índice de desenvolvimento humano ajustado à desigualdade (IDHAD) da nação. Desta forma, investir em título público já é um engajamento em prol da sustentabilidade”.
Matéria atualizada em 06/10 com resposta do Ministério da Fazenda