Dados do Censo Escolar 2023 divulgados na última semana pelo Ministério da Educação mostram que as aulas voltaram mais vazias no ensino básico. Foram menos 500 mil matrículas na rede pública. O maior recuo ocorreu no Piauí (6,43%), seguido pelo Acre (3,44%), Pará (3,36%) e Rio de Janeiro (3,36%), segundo levantamento da Agência Nossa considerando as redes municipais e estaduais.
A explicação dos governos, inclusive do Inep, que realiza a pesquisa, está no envelhecimento da população e num efeito atípico provocado pela aprovação quase que automática na pandemia. De fato, o total de crianças com até 14 anos de idade diminuiu 12,6% em doze anos, segundo o IBGE. A conta não é tão simples, mas, a grosso modo, a população da faixa etária com mais gente que precisa estar na escola diminui um por cento ao ano.
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Tudo indica que também houve migração da rede pública para a privada, que passou de 9 milhões para 9,4 milhões de alunos. Um olhar mais local revela ainda que o fenômeno está longe de ser apenas demográfico. Falemos do estado e da cidade onde está baseada a nossa redação.
A Secretaria de Educação do Estado do Rio afirma que não houve redução no número de vagas, e que, pelo contrário, a oferta foi superior ao número de matrículas efetivamente realizadas. Segundo o IBGE, o Rio continuou apresentando nos últimos anos uma das maiores taxas de escolarização do país na faixa etária de idade escolar.
As vagas existem e são suficientes no estado como um todo, mas muitas vezes em horários e distâncias impraticáveis. É o caso do que ocorre na Região dos Lagos, incluindo Cabo Frio e Búzios. A ausência de escola também afeta adolescentes da Zona Oeste do Rio. Rodrigo Azambuja, coordenador de Infância e Juventude da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPRJ), afirma que a falta de vagas tem empurrado alunos para o turno da noite: “você imagina o que é estudar à noite na Zona Norte do Rio, com apenas 14 a 16 anos?”
O maior gargalo está na educação infantil. Em Niterói, a manicure Ulle Cristina Cândida Conceição precisará alterar sua rotina de trabalho se não conseguir transferir os dois filhos do único lugar onde encontrou vagas, distante da sua casa. E a filha está na posição 215 da fila de espera da creche. Mais de três mil crianças estavam na fila de espera por uma vaga em Niterói no ano passado segundo a Defensoria Pública do estado, que entrou com ação contra a Prefeitura.
A cidade é das que mais recebem royalties e participações especiais no País devido à produção no pré-sal. A lei que determina a aplicação de 75% dos valores arrecadados para a educação, entretanto, vale para campos com declaração de comercialidade a partir de 2012, o que não é o caso de Lula (Tupi), o maior campo produtor do País. Niterói divide com Maricá os royalties e participações especiais desta mina de ouro negro que foi declarada viável bem antes desta lei.
“Na primeira fase, meus filhos foram para uma escola na Engenhoca, muito longe, e depois foram para uma no Fonseca. Aqui no Ingá não tem nenhuma vaga para o primeiro ano do ensino fundamental”. Uma solução encontrada para atenuar temporariamente a falta de escolas foi a parceria com colégios privados.
A iniciativa privada, por sua vez, tem investido boa parte da sua agenda ESG em educação. Milhões de alunos da rede pública do ensino básico são beneficiados por projetos educacionais de fundações, institutos e empresas.
Nossa reportagem mostra grandes projetos neste sentido, capitaneados por instituições como a Fundação Lemann, Itaú Social, Multiplan, Raízen e Instituto Yduqs. A educação é dos principais alvos das empresas na implementação de ações sociais. Boa leitura!
*Sabrina Lorenzi é editora-fundadora da Agência Nossa, ex-Reuters com matérias publicadas em grandes jornais e sites de notícias do Brasil e em vários veículos internacionais. Também foi editora de economia no JB e jurada do prêmio Petrobras de Jornalismo. Vencedora de seis prêmios de reportagem, denunciou crimes ambientais por empresas de petróleo e mineração.